Ford é condenada por lançamento de dois modelos do Fiesta no mesmo ano

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou propaganda enganosa e conduta comercial abusiva o lançamento, em um mesmo ano, com pequeno intervalo de tempo, de dois modelos do mesmo automóvel, ambos divulgados como sendo o novo modelo do próximo ano.

Em 1999, a Ford Motor Company Brasil lançou duas versões do carro Fiesta. O Ford Fiesta 1.0 modelo 2000 foi lançado em junho daquele ano. Em outubro do mesmo ano, saiu o Fiesta 1.0 reestilizado, com alterações estéticas substanciais. Diante disso, o Ministério Público de Sergipe (MPSE) ajuizou ação civil pública a fim de reprimir a prática comercial que considerou abusiva.

O Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE) manteve a condenação da empresa ao ressarcimento dos danos causados aos consumidores. Reconheceu ainda a legitimidade do MPSE para a ação, por se tratar de direitos difusos e coletivos, relacionados à publicidade enganosa e ao descumprimento da oferta realizada anteriormente.

Interesse social

No STJ, a Ford afirmou que cumpriu com o dever de informação da oferta realizada e que o número de consumidores afetados pela ação se limitou àqueles que compraram seus veículos em Aracaju – o que, segundo a empresa, não gera interesse social que demande a atuação do Ministério Público.

Contudo, a relatora do recurso especial, ministra Isabel Gallotti, não lhe deu razão. De acordo com ela, a Terceira Turma do STJ, em julgamento similar, defendeu a legitimidade do Ministério Público para a propositura de ação civil pública em defesa de direitos individuais homogêneos, ainda que os direitos violados correspondam a um número determinado de pessoas, ligadas por uma circunstância de fato (Recurso Especial 1.342.899). 

Gallotti explicou que a discussão ultrapassa a esfera de interesses individuais dos contratantes, mas reflete uma “universalidade de potenciais consumidores que podem ter sido afetados por uma prática apontada como abusiva”. Além disso, disse a ministra, a ação pode impedir a reiteração da conduta tida por ilegal, buscando a tutela de consumidores atuais e futuros – o que configura o interesse difuso.

Boa-fé

Quanto ao mérito do recurso, Isabel Gallotti concordou com o tribunal de origem. “O lançamento de um novo modelo de veículo, totalmente remodelado, no mesmo ano em que já fora comercializado modelo anterior, noticiado como modelo do ano seguinte, afasta-se do conceito de boa-fé objetiva exigida na lei e constitui publicidade enganosa”, opinou.

Devido ao tempo transcorrido desde o ajuizamento da ação, a ministra esclareceu que as formas de ressarcimento dependerão de cada caso concreto, sendo levadas em consideração as peculiaridades de cada hipótese – se o consumidor recebeu o veículo na época e fez uso dele ou se não se consumou a entrega.

Acompanhando o voto da relatora, a turma reformou em parte a condenação “para estabelecer que a escolha do consumidor em cada hipótese será exercida em liquidação e execução individual, sujeita ao contraditório e à decisão judicial com base nas peculiaridades de cada caso”.

Da Redação